16/04/2011

MULHERES DE ATENAS

 

Cariatides que sustentam o templo de Erecteion em Atenas

"Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas

Vivem pros seus maridos, orgulho e raça de Atenas

Quando amadas, se perfumam

Se banham com leite, se arrumam

Suas melenas


Quando fustigadas não choram

Se ajoelham, pedem, imploram

Mais duras penas

Cadenas


Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas

Sofrem pros seus maridos,

poder e força de Atenas

Quandos eles embarcam, soldados

Elas tecem longos bordados

Mil quarentenas


E quando eles voltam sedentos

Querem arrancar violentos

Carícias plenas

Obscenas


Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas

Despem-se pros maridos, bravos guerreiros de Atenas

Quando eles se entopem de vinho

Costumam buscar o carinho

De outras falenas

Mas no fim da noite, aos pedaços

Quase sempre voltam pros braços

De suas pequenas

Helenas


Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas

Geram pros seus maridos os novos filhos de Atenas

Elas não têm gosto ou vontade

Nem defeito nem qualidade

Têm medo apenas

Não têm sonhos, só têm presságios

O seu homem, mares, naufrágios

Lindas sirenas

Morenas


Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas

Temem por seus maridos, heróis e amantes de Atenas

As jovens viúvas marcadas

E as gestantes abandonadas

Não fazem cenas

Vestem-se de negro, se encolhem

Se conformam e se recolhem

Às suas novenas

Serenas

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas

Secam por seus maridos, orgulho e raça de Atenas"
(Chico Buarque de Holanda)




“Mulheres de Atenas” faz referência a aspectos da sociedade ateniense do período clássico, e a alguns episódios e personagens da mitologia grega.
A letra faz uma alusão aos famosos poemas épicos “Odisséia” e “Ilíada”, ambos atribuídos a Homero.
Em “Odisséia”, a bela Penélope, padece dolorosamente de solidão com a separação de seu esposo Ulisses, herói do poema. Durante essa ausência, Penélope se arruma, perfuma e implora a deusa Atena que providencie o retorno de seu amado ao lar.
Sua beleza e riqueza atraem a ambição de vários pretendentes que julgavam seu marido morto, ela, porém, preserva sua dignidade e absoluta fidelidade ao marido.
Na época era costume as mulheres tecerem uma mortalha para seus entes queridos, que se encontravam prestes a deixar esse mundo. Penélope usa desse artifício para ganhar tempo com seus pretendentes, que se conformaram e aceitaram de imediato, visto ser uma proposta honesta.
Penélope, no entanto, jamais a concluiria; pois na tentativa de fazer com que seus pretendentes desistissem do plano de disputar o lugar de Ulisses, ela desmanchava a noite, às escondidas o trabalho realizado durante o dia, como uma perfeita heroína romântica à espera de seu eterno amor.


 

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